15/04/2024

ArcelorMittal e a CSN perdem casos de ágio no Carf

Por: Beatriz Olivon
Fonte: Valor Econômico
A ArcelorMittal e a CSN perderam no Conselho Administrativo de Recursos
Fiscais (Carf) discussões sobre aproveitamento de ágio interno. São
cobranças bilionárias de Imposto de Renda (IRPJ) e CSLL, que foram
analisadas recentemente pelos conselheiros da 1ª Turma da Câmara Superior
- última instância do tribunal administrativo.
Os conselheiros apenas afastaram, no processo da ArcelorMittal, parcela
referente ao uso de empresa veículo, por maioria de votos. A autuação lavrada
é no valor total de R$ 1,3 bilhão e refere-se ao aproveitamento de ágio entre
2006 e 2007 (processo nº 16643.720041/2011-51).
No caso da CSN, a Receita Federal cobra R$ 1,16 bilhão de IRPJ e CSLL,
decorrente do aproveitamento de ágio nos anos de 2013 e 2014. É proveniente
da incorporação da Big Jump Energy Participações pela Nacional Minérios
(Namisa) que, por sua vez, ainda foi absorvida posteriormente pela CSN.
A cobrança sobre CSLL, porém, voltará à 1ª Turma da 2ª Câmara da 1ª Seção
para ser reanalisada porque no julgamento, realizado em 2019, foi adotado o
mesmo tratamento dado ao IRPJ, sem detalhamento. Portanto, esse ponto
ficou pendente na 1ª Turma da Câmara Superior (processo nº
10600.720070/2018-18).
De acordo com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), no caso,
após apreciar os fatos, a Câmara Superior chegou à conclusão de que a empresa
veículo foi utilizada artificialmente pelo contribuinte para que pudesse deduzir
as despesas com ágio, o que levou a turma a manter o lançamento efetuado.
“As turmas do Carf apreciam os recursos e decidem caso a caso, quando se trata
de lançamentos sobre ‘dedução de despesas com ágio’. Por isso, a jurisprudência
do Carf apresenta precedentes com resultados diferentes para o mesmo tema,
uma vez que as circunstâncias de cada caso concreto são relevantes para as
turmas formarem seu convencimento”, afirma a PGFN, em nota.
Já no julgamento da autuação fiscal recebida pela ArcelorMittal, a Câmara
Superior entendeu que havia finalidade negocial e justificativa legítima para a
utilização da empresa veículo. Por isso, decidiu anular parte do lançamento.
Não é possível saber qual o valor exato mantido nas autuações.
Apesar de tratarem de casos concretos, os julgamentos indicam a forma como
a Câmara Superior vem se posicionando em um dos temas mais relevantes - e
caros - para as grandes empresas que realizaram fusões e aquisições nas últimas
décadas.
Em fevereiro, a mesma turma derrubou uma autuação bilionária recebida pela
B3 por causa do aproveitamento de ágio na união da BM&F com a Bovespa
Holding por meio de incorporação de ações. Naquela decisão, por maioria de
votos, os conselheiros aceitaram um laudo sobre a rentabilidade futura da
operação. A partir disso, autorizaram a amortização de ágio realizada. O valor
da autuação era de R$ 4 bilhões.
No acórdão, recém-publicado, os conselheiros destacam que ainda que as partes
do negócio, com base na curva de valores das ações disponíveis no mercado
financeiro, tenham ajustado o preço do negócio em montante inferior aquele
que constou no laudo que mensurou a expectativa de rentabilidade futura do
investimento, essa diferença não desqualifica a origem do ágio (processo nº
16327.720307/2017-34).
De acordo com o advogado da B3 no caso, Roberto Quiroga, sócio do
escritório Mattos Filho, os casos levados à Câmara Superior estão sendo bem
debatidos. Para ele, existe maior estabilidade na jurisprudência atual.
Júlio César Soares, da Advocacia Dias de Souza, considera interessante, no caso
da ArcelorMittal, o fato de o Carf ter aceitado o uso de empresa veículo.
Segundo ele, ainda é um tema que provoca controvérsia. “É uma boa evolução
da Câmara Superior no sentido de que apenas ser veículo não invalida o ágio.
É necessário avaliar o motivo da criação da empresa”, afirma.
O advogado reitera que, apesar do placar apertado, de cinco votos a três, a
decisão reforça que o Carf aceita a empresa veículo desde que ela não tenha
sido criada apenas para fins tributários. O advogado lembra que esse também
foi o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar um caso de
ágio envolvendo empresa veículo.
Caio Quintella, ex-conselheiro e sócio da Nader Quintella Advogados, afirma
que o julgado da ArcelorMittal mostra uma “considerável e desejada
estabilidade da jurisprudência da Câmara Superior em relação ao ágio”, com
empate em relação às operações internas dos grupos e decisão por maioria
diante do uso de empresa veículo.
Com a aplicação do voto de qualidade, lembra o advogado, a multa fica afastada
e, caso o contribuinte opte pelo pagamento da cobrança, ficará livre dos juros
de mora, conforme alteração feita na legislação com a volta do desempate a
favor da Fazenda Nacional.